quarta-feira, 9 de maio de 2007

OLHA A ÁGUA! UM REAL!

Nada como uma tragédia atrás da outra pra alegrar o nosso dia, né? E não adianta dizer pra mim que você se preocupa com os 130 indianos que morreram num choque de trens, porque eu sei que é mentira. Aliás, você só ficou triste porque não havia UM turista com uma câmera oportunamente ligada no momento para registrar cenas do acidente.

Eu admito que adoro ver vídeos de acidentes. E se só eu gostasse, não existiriam programas de televisão que só mostrassem isso. Eu perdi a conta de quantas vezes vi o atentado de 11 de setembro, nos Estados Unidos. Sim, a cena é chocante. Sim, foi uma tragédia terrível. Mas não consigo ignorar a plasticidade do choque do segundo avião. Nota dez para os padrões hollywoodianos de acidente.

Outro dia, estava dirigindo ali por uma avenida quando de repente o trânsito parou. A reação “acho que aconteceu algum acidente” que todo mundo tem pode ser comparada à “quem morreu?” quando se ouve a música do Plantão da Rede Globo – a mesma que você escuta até o final só pra saber quem morreu. E o pior é que, quando é uma notícia de que o preço da gasolina vai aumentar, você pensa “ah, que bosta. Não morreu ninguém. Isso não é notícia pra Plantão”.

E, assim como o Plantão da Rede Globo, você já começa a se preparar pra ver o acidente. Seu coração bate mais forte, sua testa sua. Você buzina, não porque está apressado e vai chegar atrasado no trabalho, mas porque quer ver o acidente logo. Afinal, se demorar muito, o resgate vai levar a vítima embora. E se guincham o carro? Não acredito que não vou ver o estrago, você pensa.

Já estava parado há mais de meia hora e a minha vez não chegava. Comprei uma garrafa de água de um vendedor ambulante, já que ficar parado na avenida naquele calor estava me desidratando. Até o outro lado da pista, que não tinha nada a ver com o acidente, já estava ficando parado também. Todo mundo filho de Deus, né?

Faltava pouco. Era a minha vez de presenciar aquele terrível acidente, que já tinha paralisado a avenida toda. Era a minha glória. Meus pêlos já estavam se ouriçando, como se eu estivesse pronto para marcar um gol na final da Copa do Mundo. E quando eu estava de cara para o gol, o juiz marcou impedimento. Não era nada. Houve uma batida, sim, mas ninguém morreu. Aliás, ninguém nem se arranhou. Um dos carros tinha apenas uma lanterna quebrada.

E assim se formam as centenas de quilômetros de congestionamento que assolam a nossa cidade todos os dias. E assim o governo cria o rodízio, achando que tem muito carro na cidade. Tem mesmo. Tem muito carro com um curioso dirigindo. São Paulo deve ter no mínimo três vezes menos carro do que parece. O pior é que o caboclo que tem um carro odeia pegar ônibus no dia do rodízio dele – deve ser pela eficiência do sistema de transporte público. Aí quando ele junta uma grana, o que ele faz? Compra outro carro, agora com placa final dois. E a cidade fica com cada vez mais curiosos no trânsito. Só resta mesmo celebrar a existência do vendedor ambulante de água...
 
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